17 formas de dizer “não”: Comunicação complexa e pensamento não-binário

Por Adrienne Sweetwater e Mariana Barros

Durante as sessões de comunicação em nossos workshops interculturais, brincamos que os brasileiros têm 17 maneiras de dizer “não” sem realmente dizê-lo. Alguns exemplos incluem:

“Então”, “talvez”, “vamos ver”, “quem sabe?”, “veja bem”, “é uma, hein?”, “vou pensar”, “a gente se fala”, “é uma opção”, “vamos marcar”, “pode ser”, “vamos ver”, “depois a gente se fala”, “amanhã a gente conversa”, “se Deus quiser”, “você que sabe” e nossa expressão favorita: “vou dar uma passada mais tarde”.

Essencialmente, essas frases podem ser usadas para expressar o desejo de se conectar, ao mesmo tempo em que reconhecem uma impossibilidade logística. Todo brasileiro sabe que, ao ouvir “Vou dar uma passada mais tarde”, a pessoa provavelmente não vai aparecer. No entanto, essa expressão pode transmitir diversas mensagens: a intenção de estar presente, a importância da(s) pessoa(s) que já está(ao) lá e a manutenção de uma pequena janela aberta para que, caso as circunstâncias ou o humor mudem entre o momento presente e o “mais tarde”, ainda haja possibilidade de comparecer.

Enquanto esse estilo de comunicação complexo funciona perfeitamente para aqueles que entendem o contexto cultural, por outro lado, deixa aqueles que não estão familiarizados com o significado não verbalizado completamente confusos e frequentemente desconfiados. No mundo dos negócios, comunicadores lineares podem pensar: “Se essa pessoa não pode nem marcar um encontro para um café, como posso contar com ela para entregar um projeto importante?”. De fato, os estilos de comunicação brasileiros são tão complexos que o The Economist chegou a escrever um artigo sobre isso.

No campo da comunicação intercultural, os estilos comunicativos são geralmente apresentados em um espectro: de um lado, linear/direto/simples; do outro, circular/indireto/complexo. Esses termos e espectros são ferramentas úteis para ensinar os fundamentos da comunicação e fornecer explicações visuais rápidas para diferentes comportamentos culturais. Por exemplo, comunicadores lineares se sentem mais confortáveis recebendo e dando feedback direto, enquanto comunicadores indiretos geralmente priorizam medidas para preservar a dignidade, manter relações e evitar constrangimentos. Além disso, tendem a perceber a comunicação direta como algo agressivo e indelicado.

Contudo, com uma compreensão intercultural mais avançada, articulada por Milton Bennett décadas atrás, passamos a entender que a cultura, comunicada por meio da linguagem e dos comportamentos não verbais, atua diretamente em nossa percepção da realidade. Em outras palavras, pessoas de diferentes culturas experimentam o mundo de maneiras distintas. Todos nós operamos a partir de nossas mentalidades culturais específicas.

Em geral, os comunicadores diretos tendem a ser pensadores mais dualistas e binários. Isso vem da ideia iluminista ocidental de compreender o mundo por meio de comparações racionais entre verdadeiro e falso, existente ou inexistente. Por outro lado, comunicadores indiretos geralmente enxergam o mundo de maneira mais holística e complexa. É um exercício extremamente valioso para os comunicadores diretos praticarem a comunicação indireta e vice-versa. Em nossos workshops, oferecemos ferramentas práticas para desenvolver essa habilidade.

No entanto, isso não é suficiente. Desenvolver inteligência cultural significa entender como a linguagem e a cultura moldam a forma como pensamos e agimos, indo além dos espectros binários e da linguagem. É reconhecer que a comunicação monolíngue sempre limitará, até certo ponto, a criatividade, pois muitos conceitos e ideias não podem ser traduzidos. É aceitar formas etéreas e energéticas de comunicação como legítimas e válidas. É compreender que o acesso a múltiplas inteligências culturais leva tempo e envolve experiências desconfortáveis e desconhecidas, nas quais refletimos, aprendemos e criamos significado continuamente.

Em vez do ditado antigo “Quando em Roma, faça como os romanos”, encorajamos: “Quando em Roma, aprenda o máximo que puder com os romanos e torne-se uma pessoa melhor”. Claro, sua definição de “melhor” será sempre culturalmente relativa.

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